domingo, 31 de março de 2013

A Insustentável leveza do ser



Se o eterno retorno é o mais pesado dos fardos, nossas vidas,
sobre esse pano de fundo, podem aparecer em toda a sua
esplêndida leveza.
Mas, na verdade, será atroz o peso e bela a leveza?
O mais pesado fardo nos esmaga, nos faz dobrar sob ele, nos
esmaga contra o chão. Na poesia amorosa de todos os séculos,
porém, a mulher deseja receber o peso do corpo masculino, O
fardo mais pesado é, portanto, ao mesmo tempo a imagem da
mais intensa realização vital. Quanto mais pesado o fardo, mais
próxima da terra está nossa vida, e mais ela é real e verdadeira.
Por outro lado, a ausência total de fardo faz com que o ser
humano se torne mais leve do que o ar, com que ele voe, se
distancie da terra, do ser terrestre, faz com que ele se torne semireal,
que seus movimentos sejam tão livres quanto
insignificantes,
Então, o que escolher? O peso ou a leveza?
Foi a pergunta que Parmênides fez a si mesmo nó século VI
antes de Cristo. Segundo ele, o universo está dividido em duplas
de contrários: a luz e a obscuridade, o grosso e o fino, o quente e
o frio, o ser e o não-ser. Ele considerava que um dos pólos da
contradição é positivo (o claro, o quente, o fino, o ser), o outro,
negativo. Essa divisão em pólos positivo e negativo pode nos
parecer de uma facilidade pueril. Menos em um dos casos: o que
é positivo, o peso ou a leveza?
Parmênides respondia: o leve é positivo, o pesado negativo.
Teria ou não razão? Essa é a questão. Uma coisa é certa. A
contradição pesado-leve é a mais misteriosa e a mais ambígua
de todas as contradições.
 
trecho do livro"A insustentável leveza do ser "(Milan Kundera)

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